“Música pessoal e íntima — alguém (um alguém anônimo) sentado sozinho na frente do piano da escola no início da manhã, tecendo uma melodia, explorando harmonias. Música que gradualmente preenche espaços com tetos altos que compartilham da presença suave da chuva pairando no ar. Música que deixa lacunas onde é necessário. De vez em quando, precisamos de música assim, desse jeito... não, não... talvez o tempo todo. Precisamos dela tanto quanto precisamos de um café preto quente no romper da aurora e de um gato cochilando ao nosso lado à tarde.” - Haruki Murakami, tradução livre de trecho do texto sobre o relançamento do álbum “BTTB”
O músico e compositor, maestro, ator, vanguardista e arquiteto pop japonês Ryuichi Sakamoto deixou a nossa dimensão em 28 de março. Desde então estou esboçando essa edição especial e confesso: foi difícil chegar nesses álbuns.
Entre trilhas sonoras para o cinema e TV (ganhou 1 Oscar, 3 BAFTA, 3 Globo de Ouro, 3 Grammys e mais), discos solo, discos com a seminal Yellow Magic Orchestra, colaborações e participações (Caetano Veloso, Arto Lindsay, Fennesz, Alva Noto, Oneohtrix Point Never, Aztec Camera, DJ Spooky, Arca), especiais e singles, foram pra lá de 150 lançamentos em 48 anos de carreira.
Não dá pra resumir a história e a trajetória desse colosso em poucas frases, mas a partir da genialidade, do talento e da sensibilidade de Sakamoto (e de Hosono e Takahashi) gêneros musicais nasceram: Technopop, synthpop, electro, techno, acid house, IDM, Hip-Hop. Além disso, influenciou de Afrika Bambaata a J Dilla, de Aphex Twin a Juan Atkins, de Derrick May a Michael Jackson. É isso. Influenciou geral.
Separei os meus cinco discos preferidos e espero que curtam esse passeio. ;)
Para ler e ouvir:
21 de agosto, 2020 - Boombop Indica #21 - Cinco coletâneas surpreendentes: psicodelia brasileira, jazz japonês, tesouros sudaneses e electro-funk anatoliano.
31 de agosto, 2020 - Boombop Indica #22 - Monomania musical: qual é a sua?
Ryuichi Sakamoto – B-2 Unit (1980)
Pra quem curte: Anacronismo, influenciar alguém de forma abstrata e intensa, Ghost In The Shell, sintetizadores minimalistas misturados com krautrock e dub, Bowie na fase Berlim, Autechre, pop eletrônico jazz-funky melódico-expressivo-selvagem.
O hit: “Riot In Lagos” (fundamental na história da música eletrônica e do hip-hop)
Yellow Magic Orchestra - Technodelic (1981)
Pra quem curte: Se mover com o corpo cheio de glitter preto, abraçar novas tecnologias (antes de todo mundo), Monty Python, LMD-649, technopop-arte infusionado com psilocibina, letras misteriosas e perspicazes, samplers cintilantes, pianos sinuosos.
O hit: "Taisō"
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Ryuichi Sakamoto – Hidariude no Yume/Left Handed Dream (1981)
Pra quem curte: sons eletrônicos quebrados e reluzentes, a primeira mordida em uma fruta absurdamente fresca, as esculturas de Fujiko Nakaya, art-funk instrumental, Talking Heads com Brian Eno, pop imprevisível com flautas de bambu, violinos distorcidos, shō, taiko, marimba e didgeridoo.
O hit: “The Garden of Poppies”
Ryuichi Sakamoto – BTTB (1998)
Pra quem curte: Contar histórias sem usar as palavras, o som cru de um piano sozinho, Gymnopédies de Erik Satie, se perder em nuances sonoras e emoções sutis, minimalismo com impressionismo, melodias evocativas entre experimentações e abstrações, “Impressão, nascer do sol” de Monet.
O hit: “Lorenz and Watson”
Ryuichi Sakamoto – Beauty (1989)
Pra quem curte: Contemplar a beleza da simplicidade elegante, Youssou N'Dour, viagens hipnotizantes entre melodias delicadas e um emaranhado de harmonias, música folclórica de Okinawa, sons catárticos e poéticos, a junção de sons japoneses, árabes, indianos e africanos sob a lente do pop ocidental.
O hit: “Calling From Tokyo” (só nessa música tem: Arto Lindsay, Brian Wilson, Youssou N'Dour, Sly Dunbar, Pandit Dinesh e mais)
Aaah, que post mais lindo! Tinha pensado em indicar Hidariude no Yume/Left Handed Dream (1981), ainda bem que mudei de ideia. Não sei se leu a última espiral, mas falo de uma audição desse álbum que tive num lugar bem especial aqui em Berlim ha umas duas semanas.
Bárbara, fiz um post sobre as playlist do Sakamoto: https://listinha.substack.com/p/musica-pra-comer-musica-pra-morrer
Bjs